clichê

talvez uma das maiores confusões humanas seja a nossa eterna busca pelo extraordinário. passamos boa parte da vida tentando ser excelentes na escola, no trabalho, nas amizades, nas relações amorosas; fugindo da mais remota possibilidade de sermos medíocres e, raramente, nos dando conta de que, o medo de ser clichê é o maior clichê que existe. que paradoxo.

"seriamos muito melhores se não quiséssemos ser tão bons" disse freud certa vez. ou qualquer pessoa que também tenha sido inteligente e atribuiu a fala a ele por não ter a mesma fama. bom, seja lá como for, o fato é que eu também tenho muito medo de ser medíocre, de ser pequena. de ser esquecível.

e é até um pouco engraçado tamanha ingenuidade que temos ao assumir que é possível ter qualquer tipo de controle sobre o que pensam da gente ou como vão reagir ao que fazemos. por isso, sempre tentamos prever todos os cenários possíveis, desde as cenas mais trágicas até as mais bonitas, como se isso fosse capaz de prever qualquer elemento surpresa. eu chamo de loteria mental. uma situação, cinquenta milhões de cenários. o outro vai escolher um dos que você já previu.

mas aí é que tá. assim como na loteria, você tem uma chance entre cinquenta milhões. você é um. o outro tem outra chance entre cinquenta milhões. eu sou horrível em matemática, mas algo me diz que exponenciar tanto assim, faz com que seja ainda mais difícil ser capaz de prever todas as variáveis.

quando terminei meu primeiro e único namoro até então, eu não queria me identificar tanto assim com taylor swift, ou com a olivia rodrigo, ou com os milhares de filmes sobre encontrar sua própria felicidade sozinha, viajando por aí. eu tinha uma certeza absurda de que eu sabia quem eu era e o que eu queria. tão forte que não fazia sentido, de fato, ter terminado, já que eu sabia como eu queria ser tratada, os programas que eu gosto de fazer, os lugares que eu quero conhecer. como num belo roteiro. eu já tinha previsto todos os cinquenta milhões de cenários. mas a escolha de um deles, faz com que você precise pensar nas variáveis também. se formos, sei lá, pelo caminho 3, dentro dele tem mais 50 milhões de possibilidades.

e ser imaginativo assim é ótimo, dizem que eu escrevo belos textos, como esse aqui e acredito que renderiam belas músicas também, se eu ao menos soubesse compor. mas imaginar é bem diferente de viver. imaginar sofrer é bem diferente do que sofrer, de fato. imaginar felicidade é bem diferente de ser feliz. podem tentar imitar as sensações e sinapses de comer um delicioso bolo, mas jamais será igual a sentir o macio da massa preenchendo a boca, o gelado do garfo encostando na língua.

talvez o metaverso seja o exponencial do medo de ser clichê, pensando por um lado, né. enfim, só criando mais cenários aqui.

o ponto é que, apesar de ter tido essa certeza e me achar tão analisada assim também era o medo da mediocridade. se amarrar em certezas absolutas é mais uma forma de evitar a possibilidade da dúvida, da criação de mais cenários. os clichês são comuns porque muitas pessoas se identificam com ela e a gente sempre ouviu da nossa mãe que não somos todo mundo, mas somos. é estranho e um pouco chato, mas também é libertador.

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