metrônomo.

eu amava nós. não a ideia que as pessoas tinham de nós. eu realmente amava a gente, a dinâmica que tínhamos, a sincronia que criávamos, a compreensão mutua de momentos de silêncio e barulho, caos e ordem, expansão e introspecção, rápido ou devagar, ansiedade ou calmaria.

eu amava nós.

sempre nos falaram que éramos muito parecidos, mas eu sempre (talvez um pouco secretamente) discordei disso. na verdade, não só fisicamente como interna e individualmente eu achava que éramos muito diferentes, mas ao mesmo tempo, tínhamos tantas coisas em comum que arrisco dizer que era quase como se tivéssemos uma conexão esquisita e mística, dessas que em filme de ficção científica ou coisas sobrenaturais são interpretadas como transmissão de pensamento ou conexão de almas, seja lá como querem chamar.

era como se tivesse um metrônomo, ditando a frequência e, imediatamente, conseguíssemos criar uma música, sempre diferentes, como se colocássemos instrumentos que gostávamos e, a cada dia, saia uma nova harmonia. eu diria que nós contemplávamos todos os gêneros e gostos musicais, sempre havia uma música criada por nós que inspirava as pessoas e, eu, como boa leonina, confesso que adorava que o fato do nosso metrônomo ser tão milimetricamente calculado para não gerar um único ruído, gerava um misto de inspiração e inveja nas pessoas por não terem músicas tão bonitas.

então, com o tempo, sem motivo algum. não fui eu que mexi na frequência, nem foi você, mas ele ficou descompassado. eu queria bossa nova e você estava mais para um pós punk. nós olhávamos para aquela frequência estranha e diferente que estava impossibilitando novas músicas boas, mesmo com todos ao nosso redor dizendo que, veja só, elas ainda eram incríveis. era como se eu tocasse na bateria e você errasse o compasse do baixo e, de repente, a banda inteiro estava perdida, sem saber muito bem quem seguir, qual ritmo tocar.

colocamos o metrônomo no meio para escutarmos a frequência. consegui criar um bossa nova tão calma, reconfortante e lenta. você criou algo agitado, divertido, diferente. então nos olhamos, sabendo que não era ele que estava quebrado. eram as músicas que estavam diferentes.

e agora, eu não sei muito bem como a bossa nova pode ser uma música que você ainda queira escutar. estamos aqui, entendendo como nos manter em ambas playlists e usando o metrônomo para continuarmos criando outras músicas, mas eu tenho medo de não ser mais sua banda favorita e sei que você também.

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